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O Mangá que Previu Fukushima Agora Alerta para 5 de Julho: Profecia, Pânico e o Tsunami do Futuro

Uma profecia desenhada em 1999 está provocando cancelamentos em massa no Japão. Seria apenas coincidência ou estamos diante de um aviso real? O que Cal Stone, terremotos e turismo têm em comum?

Imagem gerada por IA.

E se uma história em quadrinhos fosse suficiente para fazer o mundo repensar suas viagens, refazer suas rotas e, quem sabe, evitar um desastre? Em 2025, uma previsão contida num mangá japonês está causando exatamente isso. Em um tempo em que a ciência convive com o misticismo digital, o mangá Watashi ga Mita Mirai ("O Futuro que Eu Vi") reaparece como um oráculo moderno. A autora, Ryo Tatsuki, afirma prever eventos por meio de sonhos desde os anos 1980 — e um deles aponta para 5 de julho deste ano. O suficiente para provocar histeria coletiva, queda no turismo e manchetes alarmantes. Mas será mesmo possível desenhar o futuro antes que ele aconteça?

📖 A profecia do mangá Watashi ga Mita Mirai, de Ryo Tatsuki

Publicado originalmente em 1999 e relançado em 2021, Watashi ga Mita Mirai narra os sonhos proféticos de Ryo Tatsuki, artista japonesa que afirma prever catástrofes desde os anos 1980. O mangá teria antecipado tragédias reais como o terremoto de Kobe (1995), a morte da princesa Diana (1997), o desastre de Tōhoku (2011) e até a pandemia da Covid-19 (2020). Mas foi uma nova previsão, inserida na edição de 2021, que desencadeou um medo contemporâneo: um megaterremoto seguido de tsunami no dia 5 de julho de 2025, originado pela colisão de "dois dragões" sob o mar entre o Japão e as Filipinas.

Detalhe da capa do mangá lançado em 1999, que antecipou o desastre de 2011. Segundo a autora, a visão surgiu em um sonho com tsunami. (Ilustração: Ryo Tatsuki)

A metáfora dos dragões seria uma alusão ao choque de placas tectônicas. Em meio ao simbolismo, surgem também palavras como “Gritar” e “Dualer” em telas negras, criando uma atmosfera de trailer apocalíptico. Apesar de advertir que suas visões não devem substituir alertas científicos, Tatsuki não impediu que a obra ganhasse status quase sagrado nas redes sociais.

A metáfora dos dragões no mangá remete ao choque de placas tectônicas, enquanto palavras como “Gritar” e “Dualer” reforçam o tom apocalíptico. A obra ganhou status cult nas redes, apesar dos alertas da autora. (Foto: Ryo Tatsuki)

Com sua estética simples e tom confessional, o mangá viralizou em fóruns de Hong Kong, Taiwan e Tailândia. Uma narrativa que mistura espiritualidade, catástrofe e o poder do inconsciente — e que, gostemos ou não, passou a influenciar decisões reais. Como toda boa profecia, não precisa de comprovação. Precisa apenas de fé.

📉Queda significativa nas reservas turísticas para o Japão em 2025

O impacto da previsão não ficou restrito ao campo da imaginação. Ele reverberou diretamente na economia japonesa, especialmente no setor de turismo. Segundo dados da Bloomberg e da ForwardKeys, agências de viagem em países como Hong Kong e Coreia do Sul registraram quedas de até 83% nas reservas para o Japão entre junho e julho de 2025. Na temporada da Páscoa, as reservas caíram pela metade.

As companhias aéreas Hong Kong Airlines e Greater Bay Airlines foram forçadas a cancelar voos ou suspender rotas. Um terremoto ainda não aconteceu, mas o abalo econômico já está em curso. O turismo, que vinha em ascensão com 10,5 milhões de visitantes apenas no primeiro trimestre do ano, agora enfrenta a sombra de uma data escrita numa página de mangá.

O governador de Miyagi, Yoshihiro Murai, lamentou publicamente o impacto da profecia, afirmando ser “um problema sério quando superstições afetam políticas públicas e decisões econômicas”. O governo japonês lembra que, embora o risco sísmico na região da Fossa de Nankai seja real — com 80% de chances nos próximos 30 anos —, não é possível determinar o momento exato de um terremoto.

Mas como controlar o medo quando ele é viralizado em forma de hashtags, vídeos e prints em apps de mensagem? Eis o dilema contemporâneo: a ficção ganhou força suficiente para alterar o fluxo de turistas.

 📜 As previsões contidas na obra de Tatsuki

A narrativa de Ryo Tatsuki ganhou força não apenas pelas coincidências, mas por sua forma de expressão. Ela não é uma médium tradicional, nem uma influencer espiritual. Seu trabalho é silencioso, analógico, quase arcaico. Seus sonhos são registrados em diários desde os anos 1980, muitos deles transformados em capítulos ilustrados. A autora diz não buscar fama ou seguidores, mas alertar para a importância da preparação.

Capa de dezembro de 2024 da The Economist traz símbolos de incertezas globais, mas qualquer ligação com previsões de Ryo Tatsuki é especulativa e interpretativa, sem respaldo editorial. (Ilustração: The Economist)

Em entrevista à revista Bungei Shunjū, Tatsuki compartilhou detalhes de seu sonho de 2021: uma elevação no fundo do mar entre Japão e Filipinas, ondas três vezes maiores que as de 2011, e palavras que surgiam como letreiros em uma tela escura. Um pesadelo cinematográfico que ela descreve com assombrosa lucidez.

Apesar de todo o pânico, Tatsuki enfatiza que não deseja alarmar ninguém. Suas mensagens seriam apenas lembretes para estarmos atentos aos sinais do mundo — sejam eles geológicos ou espirituais. Especialistas, como o professor Sekiya Naoya, da Universidade de Tóquio, são categóricos: a ciência ainda não é capaz de prever terremotos com precisão.

Ainda assim, a coincidência entre previsões e eventos passados confere à autora um ar enigmático. Um tipo de “profeta gráfico” dos tempos modernos, cuja caneta toca medos profundos. Se Nostradamus usava versos, Tatsuki usa quadrinhos. E o efeito é igualmente hipnótico.

 🎨 Série Manifest — Cal Stone, o garoto que desenha o futuro

Na ficção ocidental, também encontramos figuras que traduzem o invisível em imagens. A série Manifest (2018–2023), criada por Jeff Rake, conta a história dos passageiros do voo 828, que desaparecem misteriosamente e retornam cinco anos depois — sem terem envelhecido. A partir daí, passam a experimentar “chamados”: visões e vozes que os conectam a eventos futuros.

Cal Stone, personagem de Manifest, transforma visões em desenhos que revelam pistas sobre eventos futuros, deixando de ser apenas um garoto para se tornar o canal sensorial da série. (Foto: Reddit)

Entre os personagens, destaca-se Cal Stone, interpretado por Jack Messina (e mais tarde por Ty Doran). Cal não apenas ouve os chamados — ele os desenha. Suas ilustrações, inicialmente vistas como rabiscos infantis, tornam-se pistas fundamentais para os adultos evitarem tragédias e descobrirem segredos.

Em um episódio, desenha a cauda submersa do avião; em outro, figuras ameaçadoras e símbolos místicos. Seus desenhos funcionam como mapas sensoriais do que está por vir, traduzindo o invisível com tintas e lápis de cor. Cal, como Tatsuki, canaliza algo que está além da lógica.

A arte, nesse caso, não é apenas estética. É profecia. O menino que desenha o futuro e a mulher que sonha terremotos convergem numa mesma função: tornar tangível o que não pode ser explicado. Manifest oferece uma versão dramatizada do fenômeno que Tatsuki protagoniza no mundo real: a sensibilidade transformada em narrativa, e a narrativa convertida em crença.

...

Vivemos numa era em que o futuro é desenhado antes mesmo de acontecer — seja por artistas, algoritmos ou crianças em séries de TV. A história de Ryo Tatsuki não é sobre prever com exatidão, mas sobre tocar algo essencial: nosso desejo de controle em meio ao caos. Quando um mangá consegue alterar políticas de viagem e impactar economias, percebemos que o real e o simbólico estão cada vez mais entrelaçados.

Talvez não importe se o terremoto virá. Importa que acreditamos que ele pode vir. E essa crença, mesmo que embasada em sonhos ou quadrinhos, já é suficiente para transformar o presente. O futuro, afinal, é também aquilo que decidimos temer hoje.

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